A Nova Esquerda Inglesa

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011


Os debates em torno do discurso e da metodologia marxista encontram na Inglaterra, principalmente a partir da segunda metade do século XX, um grande momento de efervescência e discussão. A partir de novos olhares acerca da abordagem histórica marxista conceitos como os de alienação, luta de classes, ideologia e a relação entre base-superestrutura”, entre outros, como determinates para análise histórica, são colocados em questão. Impulsionados especialmente a partir da postura repressiva do Partido Comunista da Grã-Bretanha, no auge do stalinismo, em relação ao debate e a supressão de fatos que colocassem a prova o modelo soviético e/ou questionassem o determinismo teórico marxista, em 1956, vários intelectuais abandonaram o PC britânico e deram início a uma fase de intensas críticas e formulações teóricas contrarias ao modelo ortodoxo-marxista de análise histórica.

Baseando-se em críticas e em novas propostas, que se contrapusessem ao marxismo economicista e determinista, percebe-se a marca de uma geração, responsável pelo entendimento do marxismo como abertura crítica, formada por historiadores sociais, que ao longo das décadas que se seguiram ao fim da Segunda Guerra Mundial, formularam uma série de novas proposições e criticas ao grupo na época fortemente alicerçado nas prerrogativas teóricas de Althusser, que se apresenteva como hegemônico na análise historica marxista. Em meados dos anos de 1950, um grupo formado principalmente por Historiadores do Partido Comunista Britânico como Edward Palmer Thompson, Eric Hobsbawm, Cristopher Hill, Maurice Dobb, entre outros, constituía um dos principais núcleos de elaboração e desenvolvimento do marxismo na Inglaterra procurando compreender o capitalismo partindo de uma nova perspectiva marxista. Principalmente, ligados às questões da classe operária, produziram uma série de contribuições que avançavam no interior dos marcos conceituais do marxismo, elaborando um conhecimento histórico não apenas econômico do capitalismo inglês, embora valorizassem a História Econômica. Forçando, assim os limites da interpretação marxista dominante na época. Ressaltavam a importância e a autonomia relativa de outros níveis de análise (político, social, cultural), destacando a relevância de estudos historicamente localizados em que tais níveis pudessem ser observados.

Principalmente encabeçados pela iniciativa do Historiador Britânico Edward Palmer Thompson e em conjunto com outros dissidentes estabelece-se no final da década de 1950, um núcleo do movimento político que ficou conhecido como Nova Esquerda Inglesa. Juntamente com John Saville, Thompson funda a revista New Reasoner. Partindo de uma abordagem que priorizava a noção de humano na sociedade e de um movimento histórico relacionado a um ideal democrático, substituindo o respeito à propriedade pelo respeito ao homem e a sociedade de consumo pelo bem comum. O objetivo geral dessa iniciativa era o de substituir a figura do homem econômico representativo da sociedade capitalista pela inserção do sujeito histórico a partir de sua relação com a sociedade, sua consciência social, suas experiências e não simplesmente como um personagem atrelado única e exclusivamente as ações do estado e as premissas das econômicas macro-estatais, chegando inclusive Thompson em contraposição ao conceito economicista marxista ortodoxo, a elaborar seu conceito de “economia moral”. Em seu artigo sobre a “Nova História Política e o Marxismo” Laurindo Mékie ressalta a explicação de Thompson sobre o que o mesmo pretendia com a utilização do termo economia moral.

O meu objetivo de análise era a mentalité ou, como prefiro dizer, a cultura política, as experiências, as tradições e até as superstições dos trabalhadores que com mais freqüência se envolviam nas ações no mercado; e as relações – as vezes negociações – entre a multidão e os governantes, denominadas pelo termo insatisfatório de “motim”.(THOMPSON,APUD,MÉKIE,2008,p.109)

Tendo como primeiro livro importante, a biografia do poeta e revolucionário inglês Willian Morris, Thompson publicou também uma série outros livros e artigos onde procurava discutir a consciência da classe operária a partir dos conceitos de experiência e culturalismo. Para Thompson é através da experiência vivida que o ser social determina sua consciência social. Segundo Thompson

“Por classe, entendo um fenômeno histórico, que unifica uma série de acontecimentos díspares e aparentemente desconectados, tanto da matéria-prima da experiência como na consciência. Ressalto que é um fenômeno histórico.” (THOMPSON,1987, p. 9)

Após se juntarem a Universities and Left Review, a New Reasoner passou a se chamar New Left Review, constituindo-se assim como espaço aberto tanto do debate e divulgação de reflexões da dissidência comunista quanto de crítica ao stalinismo e à política social-democrata. Em 1960, em contraste com a perspectiva de Thompson e a de outros historiadores, vários expoentes de uma nova geração da esquerda britânica, a Segunda Nova Esquerda, assume a direção da New Left Review, dando um novo tom ao debate político da revista e da esquerda inglesa, agora fortemente influenciada pelas idéias de Louis Althusser e seu estruturalismo marxista. A partir do momento em que a New Left Review toma novos rumos sob a influência de Althusser, o embate teórico interno no núcleo da Nova Esquerda fica explícito, e em resposta aos artigos de Perry Anderson, Tom Nairn e a Althusser, Thompson elabora uma série de críticas ao modelo teórico desses autores. Críticas essas explicitas em obras como “As peculiaridades dos ingleses e outros artigos” (um conjunto de artigos), “A Formação da Classe Operária Inglessa” e registradas principalmente em “A Miséria da teoria ou um planetário de erros” onde o autor coloca em questão o determinismo, o conceito de classe e o estruturalismo, entre outros, entrando em rota de colisão com a ortodoxia marxista da época e com o grupo encabeçado por Louis Althusser. Sobre Thompson Norberto Ferreras diz

O engajamento anti-stalinista o levou a fortes choques com aqueles que ele identificou como defensores da perspectiva stalinista, mesmo que suas posições políticas não fossem pró-PC-URSS. Isto levou a que Thompson estivesse orientado à depuração do marxismo das suas implicações estruturalistas, tanto na sua produção especificamente histórica quanto na teórica. Thompson identificava o estruturalismo como a teoria própria do marxismo da guerra fria e, portanto, funcional ao stalinismo e ao mecanicismo do mesmo, que depreciava o humano e a diversidade de experiências.(FERRERAS,2009,p.09)

Mais do que se contrapor ao um modelo metodológico, as formulações teórico-metodológicas feitas pela Nova Esquerda contribuem de maneira importante para a renovação e o aprimoramento das discussões em torno do marxismo, a partir do momento em que sua abordagem prioriza a noção de humano na sociedade, em um contexto histórico relacionado à luta pelo ideal democrático no mundo, questionando o respeito à propriedade em detrimento do respeito ao homem.

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